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domingo, 18 de abril de 2010

Saudade: o carrasco da ausência ou a feiticeira do encantamento?



Sabe... É preciso saber lidar com a saudade. E essa é uma das coisas mais difíceis de se fazer nessa vida. É o lidar com uma ausência. Pense como é estranho ter que dar conta de algo assim tão abstrato.
É tão estranho quanto a idéia de "vazio", de "nada". Nós temos tanta dificuldade, que tivemos que criar um símbolo para ele: o "zero". Assim pudemos torná-lo palpável, visível, articulável. Pudemos incluí-lo em nossas operações matemáticas, que evoluíram surpreendentemente. Porque sabíamos que 2 laranjas + 1 laranja = 3 laranjas. Mas e 2 laranjas - 2 laranjas = ?

A Paola, uma pessoa incrivelmente amável e sábia, explicou um dia que a gente não pode compreender alguma coisa dizendo o que ela não é. Se eu seguro uma maçã e digo: "Isso não é uma pêra", não estou dizendo que é uma maçã!
Assim, como é que podemos entender o vazio? Como a ausência de alguma coisa? Mas dizer que um jarro está vazio porque não está preenchido por água, por exemplo, não é definir o vazio.

Eu comecei a divagar assim falando da saudade... Pois bem, tentando retornar ao gênese da postagem, como é que vou compreender a saudade pela ausência de alguém ou de algo?
O que será que sentimos quando dizemos ter saudade de uma pessoa? 
Uma vez recebi uma carta dizendo que "saudade é não saber..."  (Mais uma vez definindo pela negação...) Dizia que saudade é não saber se a outra pessoa continua fazendo as mesmas coisas, se foi ao dentista na quinta-feira como sempre, se ainda vai no mesmo cinema, se continua gostando de sorvete com banana, se ainda usa aquela jaqueta jeans desbotada, se ainda  gosta de ler até de madrugada... É não saber.
Será mesmo? POde até não ser essa a definição de saudade, mas corresponde ao que as vezes sinto por algumas pessoas que marcaram a minha vida.
A saudade é doída porque o não saber nos diz da distância que o bendito ou bendita está de nós. Distância física ou emocional...
A distância, seja lá qual for, impossibilita o abraço, o beijo, o olhar (se bem que agora tem o Skype... MAs não é a mesma coisa!). Pior é quando a distância é daquele segundo tipo, porque o indivíduo pode estar ali, na sua frente, mas permanece inalcançável! Situação que pode atingir pais e filhos, amigos, amantes, gente ligada (ou desligada) a outras "gentes" das mais diversas maneiras.



No entanto, a saudade pode ser maravilhosa e, mais ainda, necessária! Como disse Rubem Alves, "é a saudade que nos torna encantados" (A menina e o pássaro encantado). A saudade maltrata, machuca mesmo, mas quando a pessoa de quem estamos saudosos retorna, a euforia é incontrolável! Experimentamos a felicidade do retorno, como na parábola do filho pródigo (ou, como tem sido chamado agora, do Pai misericordioso). A alegria de ver quem estava, para nós, perdido em meio às coisas distantes, de volta ao convívio. A alegria de saber que ela ainda usa a saia vermelha, mas agora a blusa que a acompanha é branca, que ela ainda adora chocolate quente, mas tem achado os martinis da vida muito interessantes, que ela trocou de curso porque descobriu que era subversiva demais para ficar naqueles moldes acadêmicos e que o cachorro que a acomanhava a 7 anos, morreu, mas que, apesar de ainda chorar quando vê uma foto sua, hoje só se lembra das coisas boas que passaram juntos! É a alegria de saber. De compartilhar dias e noites. De ouvir as histórias que ela tem para contar de suas aventuras longínquas.


Desse modo, concluo repetindo o que disse no princípio: é preciso saber lidar com a saudade. E essa é uma das coisas mais difíceis de se fazer nessa vida...

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Aquele diante do espelho




Hoje me olhei no espelho e, num repente, me surpreendi ao olhar dentro de meus próprios olhos. Não é incrível que nós possamos ter consciência de nossa existência? Espera! Não estou falando bobagens, nem estou ficando maluca. Ao menos não mais do que todos somos naturalmente e necessariamente para que possamos suportar "o confronto com a consciência da morte e as agruras da vida" (Resende, 1997). (É que eu estava estudando Psicopatologia...)

O que tento explicitar em forma de conteúdo verbal é que fiquei perplexa em pensar na complexidade humana. É mágico! Mágico saber que alguma coisa que não é palpável, não é mensurável, não é observável faz com que estejamos vivos!
Alguns acreditam que o cérebro humano tem a chave para todas as respostas. Talvez tenha... Mas ele é só um órgão. Um magnífico orgão, é verdade, mas apenas isso. Ele é matéria e sua existência explica a maneira como funcionamos, já que ele é nosso instrumento de comando. Mas há alguma coisa a mais que faz com que eu me reconheça e reconheça toda a minha história ao olhar dentro dos meus próprios olhos no momento em que miro o espelho.
Sabe quando os médicos se debruçam horas sobre uma pessoa deitada numa mesa de cirurgia, fazendo tudo o que a ciência médica o permite para salvar a vida daquele ser e ele corre contra o tempo, apenas porque ela ainda está viva! Quando o aparelho envia o grito fatídico, tudo pára: o tempo, as mãos, os olhares, os corações, a respiração, os sons. Acabou. Todo o esforço foi em vão, porque algo se foi. O cérebro parou, o coração parou. Parou de funcionar, quando podia estar funcionando. O que é que se vai? O que é que não está mais ali?!

A vida. O sopro de vida. A alma. Aquilo que faz com que nós acordemos todos os dias, sendo aquilo que construímos, aquilo que somos. Aquilo que eu posso reconhecer ao olhar dentro dos olhos.

"A janela da alma". Não é assim que nos referimos aos nossos olhos? Não é à alma que os pais de crianças autistas tanto queriam ter acesso?

É mágico, sim... E por isso mesmo gera tanta curiosidade. É um imenso desafio, que ainda não sei se deveremos vencer... Talvez seja mais urgente o resgate de nossa alma, que a compreensão dos porquês que rondam a neurociência.
Sim, porque nos dias atuais é muito mais fácil encontrarmos pessoas que cuidam de seus cérebros, mas não de sua alma. Sabem exatamente que área dele faz o quê, mas não tem intimidade com aquele que te olha no espelho. Não sabem quais os anseios, limites e desejos desse que parece tão perto e tão distante...

Heidegger diz que a angústia diante da noção de finitude, diante da consciência da morte, é algo que toca todos os seres humanos em algum momento da vida. É uma das poucas coisas que podemos dizer que é de todo ser humano.
Então sugiro que todos conheçamos o cara ou a garota do espelho bem direitinho, para que na hora de partir nós possamos nos despedir em paz de nosso corpo, pois estaremos em boa companhia a partir de então...