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terça-feira, 1 de junho de 2010

Replanejamento político

Em ano de eleição, vejo-me cutucada a falar sobre isso aqui no blog, porque estar atento às candidaturas, propostas e perfis também é cuidar do que se ama. É também ser "responsável pela rosa"...

Eu, que nunca fui uma pessoa que se importasse tanto assim com a política, hoje me sinto responsável por cuidar de quem irá cuidar, de um outro ponto de vista, do nosso país. Alguém que terá poderes que nós não teremos, mas que deverá tomar as decisões que lhe cabem, respaldando-se no que será melhor para o povo por ele representado.

A política, ao meu ver, perdeu muito de seu sentido original. Lá na Grécia Clássica (tempão, hein!) com o surgimento da pólis, surge também a preocupação em escolher pessoas que a administrariam bem. Platão defendia a ocupação desses cargos administrativos por filósofos e reis, que usariam a "alma racional" para bem fazê-lo. 

OK, deixando um pouquinho de lado essa supervalorização da racionalidade, o princípio que regia a política na época era a que a pensava como um valor, sendo sua existência justificada pela finalidade de proporcionar uma "vida boa" (entendida naquele momento como racional, feliz e justa, própria dos homens livres).

Posso não concordar com esse enaltecimento da vida racional, mas, compreendendo a racionalidade como compreensão da realidade, consciência de sua existência em um mundo e de sua função e participação nesse mundo, a política então tinha um por quê de existir permeado de muita dignidade.

Hoje em dia "política" e "dignidade" parecem impossíveis de existir em uma mesma frase...

Ontem mesmo flagrei um pensamento passando sorrateiramente em minha mente (quase uma atenção flutuante aos meus próprios pensamentos) e senti que tive um insight tão... óbvio! É completamente injusto que todos paguem impostos, mas poucos tenham acesso à saúde, à educação, à segurança...

Vamos pensar tudo isso de uma perspectiva microorganísmica. Imagine que nós façamos parte de um povo nômade, que em um determinado momento encontra lugar propício para estabelecer acampamento. E permanecemos ali por longa data, até que algumas gerações tenham se acostumado a uma vida sedentária e abandone a vida nômade por tempo indeterminado. Ora, aos poucos nos veremos com algumas necessidades básicas e, como comunidade que somos, sentaremos para pensar juntos alguma solução. Alguém então, terá a brilhante idéia de reunirmos parte da produção de cada um (dos produtos alimentícios, do artesanato, das ervas medicinais) em uma central de distribuição. Uma pessoa será responsável pela distribuição justa dos produtos arrecadados para todos aqueles que contribuíram e aqueles que possuiam mais, contribuiriam com uma quantidade proporcional para atender àqueles membros da comunidade que não podiam se cuidar sozinhos (os membros muito jovens, os mais velhos e os portadores de alguma doença).

Porém, esse responsável começa a pensar que se tirasse um pouquinho a mais para a família dele, ninguém perceberia. Mas todo mundo percebeu e daquele momento em diante, todo mundo queria ocupar o cargo de responsável pela distribuição das reservas para tirar um pouquinho para si.


Se reconheceu nessa comunidade? Quando será que nós passamos a não tomarmos conta de nossa própria vida em detrimento das vontades deste responsável (que hoje não é mais uma pessoa, mas um sistema enorme e pesado)??

O fato é que todo esse processo levou a algo de proporções tão grandes que nós perdemos a visão do macro, da forma ampliada do problema. Nos preocupamos com os nossos impostos, nossas contas, nossa casa, nossa saúde, mas perdemos a noção de comunidade! Isso porque não conseguimos ver nossa contribuição aplicada. Sei que pago impostos absurdos, mas minha rua é cheia de buracos, os postes há anos não vêem lâmpadas inteiras, o posto de saúde nunca tem atendimento adequado, a escola não é mais lugar de gente que quer passar o seu conhecimento adiante! Todo mundo tem que saber de tudo, e no final das contas saímos da escola sem saber de nada, como meros "copiadores" - como diria sabiamente a Estamira.

E a universidade?? Os impostos pagos não garantem que você poderá ter acesso ao Ensino Superior, porque não há número suficiente de vagas, não há número suficiente de universidades para os que gostariam, então opta-se por um processo de seleção que, em minha opinião, será sempre falho, pois nunca conseguiremos avaliar de maneira correta e completa alguém cujo desenvolvimento desconhecemos.

Na pequena comunidade sabíamos de quem cobrar: íamos direto ao responsável e toda a comunidade poderia se reunir para cobrar que sua contribuição fosse dividida de maneira a garantir a equidade! Mas um sistema tão grande quanto o que construímos tem autonomia suficiente para criar todas as barreiras burocráticas possíveis. Jamais uma pessoa como eu, sem importância política alguma, poderia bater à porta do gabinete presidencial e dizer: "Escuta, você acha mesmo justo que seus ministros ganhem horrores, enquanto ali embaixo - pelo amor de Deus, é só descer as escadas! - existem pessoas definhando de fome? Fome! Necessidade de arroz! De feijão! De bife acebolado! De alface fresquinha! De rodelas de tomate! De letras! De música! De dignidade!"
Não... "Eles", os responsáveis pela distribuição, criaram a burocracia. Os processos. Procedimentos eficientes em protegê-los de todo e qualquer contato com a comunidade que grita - ou não - a injustiça que presenciam há séculos.


Minha sugestão: auto-gestão! Criemos novamente pequenas comunidades auto-suficientes. Não pagaremos impostos, visto que não utilizaremos quaisquer rescursos públicos. Educaremos nossas crianças com o que for necessário para se viver na comunidade, plantaremos aquilo que gostamos de comer, cuidaremos de nossos doentes com o que a natureza tem de melhor a nos oferecer. Construiremos nossa moradia e não teremos que pagá-la infinitamente, correndo o risco de perdê-la caso o pagamento do imposto não seja efetivado. Não precisaremos de carros, pois tudo será muito perto! No máximo uma bicicleta. Desse modo, para quê combustível?

Só não acho justo que não tenhamos acesso às conquistas tecnológicas de toda humanidade, pois elas custariam muito caro a quem não possui moeda de troca. (Sim, porque não teríamos dinheiro.) Mas talvez esse seja o preço a ser pago pela dignidade da vida de nossa pequena comunidade. Dignidade que será preservada pela política da comunidade e, dessa vez, não será negligenciada.


P.S.: Para o verdadeiro êxito dessa suposta comunidade, muitas outras coisas teriam que ser pensadas e esse texto não caberia mais em um blog, pois seria um grande projeto. Mas ela é possível! Porém, logo teríamos que pensar estratégias de defesa, pois o resto do mundo iria, com certeza, querer nos atacar. Nós, uma ameaça ao poder vigente, cuja única pretensão é a de querer viver em paz.